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segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Do Caminho (caminhar)

Tocando em Frente

Ando devagar porque já tive pressa
E levo esse sorriso porque ja chorei demais...
Hoje me sinto mais forte
Mais feliz, quem sabe?
Eu só levo a certeza do que muito pouco eu sei...
E nada sei...
Conhecer as manhas e as manhãs....
O sabor das massas e das maçãs...
preciso amor para poder pulsar...
preciso paz para poder sorrir...
preciso chuva para florir...
Penso que cumprir a vida seja simplesmente
Compreender a marcha e ir tocando em frente...
Como um velho boiadeiro levando a boiada
Eu vou tocando os dias pela longa estrada
Eu sou...e pela estrada eu vou...
Conhecer as manhas e as manhãs...
O sabor das massas e das maçãs...
preciso amor para poder pulsar...
preciso paz pra poder sorrir...
preciso chuva para florir...
Todo o mundo ama um dia...todo o mundo chora...
Um dia a gente chega... o outro vai embora...
Cada um de nós compõe a sua historia...
e cada ser em si carrega o dom de ser capaz de ser feliz...
Conhecer as manhas e as manhãs...
O sabor das massas e das maçãs...
preciso amor para poder pulsar...
preciso paz pra poder sorrir...
preciso chuva para florir...
Ando devagar porque já tive pressa
E levo esse sorriso porque ja chorei demais...
Cada um de nós compõe a sua historia...
e cada ser em si carrega o dom de ser capaz...de ser feliz..


Tocando em Frente, sublime quando cantada por Maria Bethânia (aqui)

Tenho andado triste. Hoje, vi-me no espelho e quase me reconheci na cara triste que vi. Não pode ser! Eu não sou assim - e não quero ser assim!

Procurei as minhas coisas - tenho uma montanha de lembranças, de recordações, de escritos, de notas, de palavras e objectos que só para mim encerram mundos, lições, aspirações, emoções, ligações... Não é bem um roteiro da saudade; é mais uma mala de ferramentas que me consertam o alento.

Guardo, por exemplo, um fósforo assinado por um Amigo que mo afereceu dizendo-me: "Vou-de dar a lembrança mais original que alguma vez hás-de receber na tua vida." Na altura ri-me do disparate; hoje sorrio perante a natural arrogância da nossa juventude; 25 anos passados, dou-me conta que essa espontaneidade, essa capacidade de decidir que este há-de ser um acto irrepetível na nossa vida se foi, subjugado por alguma tibieza, por algum conformismo ou, pior, algum conformismo.

Naquele dia, o gesto foi mais um - daqueles que eram de todos os dias; a que se seguiriam infindáveis dias que o transformariam em disparate, ultrapassado que fosse por um gesto "de verdade".

Hoje, o fósforo faz parte dessa ferramenta que, não me tendo alegrado (claro!) me faz lembrar que cada ser carrega em si o dom de ser capaz de ser feliz. De tomar o destino nas nossas mãos.

Hoje, decido que quero sair da boiada e passar a tocar o restante pelo meu caminho!

Que saudades que eu tinha da minha caixa!




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sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Da Esperança (apesar da Mágoa)

Acima de tudo, gostaria que os dias de feliz expectativapelo momento do nosso encontro voltassem.
Gostaria que o imenso amor que tenho por ti, sendo percebido, fizesse sentido ainda nas nossas vidas.
Que falássemos tudo o que tem de ser dito mas não neste tom.


Sem resposta.




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terça-feira, 2 de novembro de 2010

Da Vida (constatação)

"E por vezes sorrimos ou choramos

E por vezes por vezes ah por vezes
num segundo se envolam tantos anos."
excerto do poema E por vezes as noites duram meses de David Mourão Ferreira




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quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Da Vida (sonho)

"E defendo-me da morte povoando
de novos sonhos a vida."

excerto do poema Mesa dos Sonhos de Alexandre O'Neill



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segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Da Vida (amigo)

"Procura-se um amigo


Não precisa ser homem, basta ser humano, basta ter sentimentos, basta ter coração. Precisa saber falar e calar, sobretudo saber ouvir. Tem que gostar de poesia, de madrugada, de pássaro, de sol, da lua, do canto, dos ventos e das canções da brisa. Deve ter amor, um grande amor por alguém, ou então sentir falta de não ter esse amor.. Deve amar o próximo e respeitar a dor que os passantes levam consigo. Deve guardar segredo sem se sacrificar.

Não é preciso que seja de primeira mão, nem é imprescindível que seja de segunda mão. Pode já ter sido enganado, pois todos os amigos são enganados. Não é preciso que seja puro, nem que seja todo impuro, mas não deve ser vulgar. Deve ter um ideal e medo de perdê-lo e, no caso de assim não ser, deve sentir o grande vácuo que isso deixa. Tem que ter ressonâncias humanas, seu principal objetivo deve ser o de amigo. Deve sentir pena das pessoa tristes e compreender o imenso vazio dos solitários. Deve gostar de crianças e lastimar as que não puderam nascer.

Procura-se um amigo para gostar dos mesmos gostos, que se comova, quando chamado de amigo. Que saiba conversar de coisas simples, de orvalhos, de grandes chuvas e das recordações de infância. Precisa-se de um amigo para não se enlouquecer, para contar o que se viu de belo e triste durante o dia, dos anseios e das realizações, dos sonhos e da realidade. Deve gostar de ruas desertas, de poças de água e de caminhos molhados, de beira de estrada, de mato depois da chuva, de se deitar no capim.

Precisa-se de um amigo que diga que vale a pena viver, não porque a vida é bela, mas porque já se tem um amigo. Precisa-se de um amigo para se parar de chorar. Para não se viver debruçado no passado em busca de memórias perdidas. Que nos bata nos ombros sorrindo ou chorando, mas que nos chame de amigo, para ter-se a consciência de que ainda se vive."

Texto de Vinicius de Moraes que encontrei aqui.


Está tudo dito, não é?

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domingo, 24 de outubro de 2010

Do Adeus (Outono)

DAWN


To wake, and hear a cock
Out of the distance crying,
To pull the curtains back
And see the clouds flying
- How strange it is
For the heart to be loveless, and cold as these.
Poema de Philip Larkin (1922 - 1985)

E como é estranho - ou será mesmo cruel? - constatar que, contra o enternecedor rubro deste Outono, é cada vez mais certo que a evolução anunciada será mesmo "the heart to be lovesss".




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sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Do Vazio (Deus)

"(...) com Ele, pelo menos, temos a certeza de poder romper indefinidamente..."


Quando, por desejo de solidão, rompemos os laços que tínhamos, o Vazio apodera-se de nós: mais nada, mais ninguém...

Uma tal perplexidade aproxima-nos de Deus: com Ele, pelo menos, temos a certeza de poder romper indefinidamente..."
E. M. Cioran, Silogismos da Amargura, 2009, Letra Livre, Lisboa, p.83


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quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Da Palavra (Confissão)

"Lembra de mim!
Se existe um pouco
De prazer em sofrer
Querer te ver
Talvez eu fosse capaz
Perto daqui
Ou tarde demais..."

excerto da canção Lembra de mim de Ivan Lins

 
Tenho andado inquieta. Não gosto de coisas mal resolvidas. Não gosto que a palavra fique por dizer quando tem tanto a laborar.
 
Mesmo quando é penosa, mesmo quando não resolve problemas ou questões, a palavra honesta e clara sempre constrói mundos. Mesmo que o construir mundo signifique derrubar um para permitir a construção sólida de um novo mundo. No limite, ainda que tal signifique deitar abaixo uma construção insustentável para que esta não assombre o que vai ficando.
 
A medo - será que me habituei a viver nesta dúvida? - lá enviei a sms (tão previsível...) ontem. Mas a resposta não veio. Um simples pedido de colocar as "coisas" em ordem foi ignorado: ontem e todo o dia de hoje.
 
Apesar das evidências, eu ainda esperava poder dizer-te que compreendo que te afastes, que não haja futuro para um "nós". Para que pudéssemos manter algum contacto. Apesar de tudo - sobretudo da tua silenciosa ausência - continuo a preocupar-me contigo.
 
Ao longo da minha vida, uma ou outra ruptura aconteceu - felizmente muito poucas, felizmente de pessoas que não foram - de longe! - tão importantes como tu. Mas essas pessoas seguiram as suas vidas, não me recordo de ter por elas esta estranha, inquietante necessidade de as procurar para saber se estão bem.
Ontem descobri porquê: porque essas continuam geograficamente perto, de vez em quando encontro-as, ou sei delas por outras. Mas tu: estás a 300 km; só eu te conheço. Nunca saberei de ti por mais ninguém senão por ti.
 
Por isso, o contacto. Não para dizer o "amo-te" - embora verdadeiro, sentido, muitas vezes insolente perante a minha racionalidade. Apenas para dizer: se não vamos ser "nós" vamos ser amigos, daqueles que se falam nas festas, com conversas de circunstância, banais. Mesmo nessas palavras banais eu poderia saber que estás bem. Ou perguntar se podia ajudar.
Assim, nem isso. Custa-me ter de viver em inquietação pelo teu bem-estar, pela tua felicidade.
 
Porque te amo.
 
Apesar de saber que amar nem sempre é suficiente.
 
 
 
 
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sábado, 9 de outubro de 2010

Da Vida (declaração)

Amo-te porque preciso de ti.
Preciso de ti porque te amo.


Ouvi estas palavras de uma conviva de viagem, em Agosto. Disse-as a outra, com o conselho de que a segunda formulação seria a correcta.

Disse ainda que isto se aplicava a tudo: aos Pais, ao parceiro, à própria vida. Pareceu-me um trocadilho de gosto duvidoso, devo confessar.

Após alguma reflexão, começou a parecer-me sensato.

Hoje estas palavras regressaram de tão longe, chamadas pelas fotos da viagem e por mais alguma tristeza neste lugar onde estou sem ti.

Acho que eu estava (estou) no trilho certo: preciso de ti porque te amo. Porque te conheço e te reconheço no que trazes (ainda) à minha vida. Continuas (sempre o serás, creio) a minha metade. Não porque me completas mas porque sempre serei menos sem ti.

Por isso preciso de ti. Porque te amo. Apesar de ter de viver sem ti.




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sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Dos Dias (vazio)

"Who am I?

Nobody knows but me
Nobody knows but me
Who am I?
Nobody else can see
Just you and me
Who are we
Oh My Love Oh My Love"
excerto da canção Look at me de John Lennon

Detesto estes dias: escuros, molhados, tristes!

Juntar-lhes uma conferência superlativamente monocórdica e desinteressante teria, claro, de redundar em tempo de introspecção. O que, por estes dias, não é a melhor coisa...

Fui intercalando a música. John Lennon, em jeito de homenagem no aniversário do seu nascimento. Parece que todas as suas músicas se tornaram clássicos. A mim, parecem-me depositadas não sei em que espaço da minha mente - só esporadicamente regressam mas, quando o fazem enchem o meu pensamento.

Palavras tão simples - mas exactamente aquelas que criam mundos. Consigo ver-me nelas quando estou algre, quando estou triste, quando estou em dúvida...
Quantas vezes me substituem sempre tristeza por serena ternura, suavizando lamentações,...

Hoje, apercebi-me que no meu peito não há um lugar vago. Há o teu lugar. Que não ocupas, mas que ainda assim é o teu lugar.

"Nobody else can see."
 
 
 
 
 
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domingo, 3 de outubro de 2010

Do Ser (procura)

"É melhor ser alegre que ser triste
Alegria é a melhor coisa que existe
É assim como a luz no coração"
excerto de Samba da Benção, de Vinicius de Moraes

Ontem assisti ao filme "Comer Orar Amar". Mais um filme onde a vida atinge um ponto de ruptura, onde o horizonte é de desnorte, seguindo-se uma caminhada redentora que culmina num novo ponto de ruptura - desta vez feliz. Feliz para sempre...

Parece que na vida "real" estas coisas acontecem mesmo (o livro que serviu de base ao filme relata uma experiência concreta).  Quantas vezes enfrentamos os nossos desnortes, as nossas dúvidas?

Pensei no meu percurso pessoal. Perguntei-me se eu poderia arriscar uma mudança tão radical, tão livre (porque não controlada) na minha vida. A primeira resposta veio-me em forma de dificuldades: o vínculo laboral, o custo, as responsabilidades, a incompreensão dos que vivem comigo... Aqui parei para repensar a resposta, claro. A incompreensão dos outros? Vivo para os outros? Espero a sua aprovação?! Se fosse crucial para mim, não iriam compreender e apoiar-me?

O caminho dos pensamentos é perigoso. Voltei atrás, que é como quem diz a mim própria: tenho, de facto, vontade de empreender uma procura destas? Se pensar na "aventura", na viagem geográfica pura: gostaria, pois. Mas é viajar, apenas. Partir e saber que volto ao ponto de onde parti: o lugar geográfico, o espaço físico, mas, sobretudo, para o lugar dos afectos. Para "os meus".
E ainda me perguntei se tenho necessidade de fazer esta viagem. Embora de forma não definitiva, a resposta parece-me ser um não. Sei quem sou, procuro sê-lo o mais possível e cada vez mais vou conseguindo ser.

No final do filme, a palavra-chave da protagonista chegou: "attraversiamo" (atraversamos). Esta poderá ser também, julgo, a palavra-chave da minha vida: atraversar os momentos com todos e com tudo que eles carregam: a alegria, a tristeza, o risco, o certo... É sempre no certo que ancoro o risco e na alegria que ultrapasso a tristeza.

Dentro de mim sei que atraverso os meus momentos numa sucessão de ofertas e de dádivas, onde o sofrimento e os obstáculos se vão superando com empenho, com carinho e com alegria. A tristeza, a solidão e o desencanto existem, claro. Mas são atravessados. Porque alegria é a melhor coisa que existe.



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quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Da Vida (sopro)

"...foi assim uma aventura, cheia de problemas e desencontros, desconforto... [...]. Mas havia determinação do JK, e a coisa prosseguiu.
Porque eu acho que a vida é assim. A gente tem que separar as coisas.
A vida é chorar e rir a vida inteira. Aproveitar os momentos de tranqüilidade e brincar um pouco. Depois, os outros é agüentar.
A vida é um sopro né?“

Excertos de um depoimento de Oscar Niemeyer para o filme A Vida é um sopro

Há dias que andava firme em torno da decisão. É a única racional a tomar. Pensava então. Penso hoje, também.

Mas há dias em que se intromete um insidioso "se...". Decerto que o conheço - não sei se lhe chame uma verdadeira dúvida relativamente ao acerto da decisão tomada ou se uma esperança de que a mesma esteja errada.

Hoje, foi um (de vários, enfim...) desses dias. Acordei sem o conforto de te saber por cá, sem a feliz expectativa do momento em que partilharíamos as pequenas coisas e loisas do nosso dia a dia; em que, por palavras (repetidas mas sempre calorosamente novas e tão nossas) ou por atitudes e atenções íamos expressando amorosamente o sentimento que nos une. Foi um dia de saudade.

Hoje, foi um desses dias. Um aperto no peito... Uma saudade... E... Se...

A decisão é certa, não vacila. Mas... e se as suas premissas não estiverem correctas?... e se há alguma coisa que jexplique este comportamento?... e se aconteceu alguma coisa?...
A decisão já não era tão certa. Um "se" de dúvida que se foi transformando em "se" de preocupação.

E estas palavras de Niemeyer que por acaso encontrei: pareciam um sinal. Não que eu acredite neles...

Tudo me impelia. Mais a minha vontade, a minha saudade e uma tremenda esperança (de onde me vem?!...).

Falei. Constatei que não havia acontecido nenhum acidente (ainda bem!) nem sequer surgido um obstáculo novo. Palavras desconexas. Algumas palavras de circunstância. Fiquei vazia. Estou vazia.

A vida é um sopro. Mas tu não estás cá.





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terça-feira, 21 de setembro de 2010

Da Despedida (gesto)

Despedi-me do teu peito:
Do lugar onde repousava a cabeça
Do afago onde buscava conforto
Da curva terna onde eu me completava...

Despedi-me do bater do teu coração:
Da melopeia que me embalava
Do retumbar onde eu lia o teu amor
Do troar que nos tornava um.



Sózinha, reparo que me despeço mais de mim - do que fui, do que procurei, do que entreguei - do que de ti.


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sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Da Sabedoria (presságio)

"Mais tarde, muito mais tarde, talvez se lembrasse das mãos dele sobre as suas, como um ferimento no peito; então desejou que a neve também apagasse esse ferimento ainda distante."

excerto de Lunário da autoria do Poeta Al Berto
 
 
Estranho como nas palavras de alguém vemos reflectido com exactidão e clareza aquilo que não conseguimos - tememos? - descrever!

Inquietante como revejo um sentimento tão íntimo espelhado nas palavras de um dos Poetas favoritos daquele que me causa esta ânsia.

Como se fosse um presságio.
 
Só que o meu ferimento não é distante. Instalou-se por cá. Temo que apenas aguarde a neve do tempo para se ir esbatendo.
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Do Mistério (partilha)

"Ao crepúsculo espelha
sol e lua nos flancos"
excerto do poema O Navio de Espelhos, de Mário Cesariny














Fotografia da autoria de Francisco Barbosa
A quem agradeço a generosa atenção e a maravilhosa dádiva


Inseridos em portentosa e surreal alegoria, a imagem destes dois verso abre o poema e prepara o espírito a quem lê as palavras inquietas e se revolta nas suas metáforas duras e escuras.
Estes dois versos impelem-nos a sermos, independentemente de tudo o que nos rodeia não ser aquilo que desejamos.
Dizem-nos que podemos viver no fio da navalha (entre o sol e lua), que podemos iluminar caminhos (ser farol...).
Dizem-nos que, contra todas as evidências e expectativas, podemos ser aquilo a que aspiramos.
No mistério que é o encadear dos momentos na vida de cada um, eis-me comovida perante este sortilégio: palavras que não me foram proferidas, mas palavras que tomo para mim: mais do que esperança, urgem-me a que construa o meu caminho, transformando - não me quedando no crepúsculo. Melhor ser Sol. Ou pelo menos Lua.
Bem que precisava desta partilha.



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terça-feira, 31 de agosto de 2010

Do Amor (existência)

"Somente as coisas tocadas
Pelo amor das outras
têm voz"
excerto de um poema de Fiama Hasse Pais Brandão

Hoje, na costumeira hora de entretenimento diário com os jornais (não, não são os jornais que são diários: é mesmo o meu entretenimento...), encontrei em grandes letras a inscrição que transcrevi.

Uma inscrição que é um luzeiro. Em palavras simples, a evidência que somos amor.

É uma felicidade ser-se retratada assim!





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domingo, 29 de agosto de 2010

Vida (círculo)

"O que dirá de mim o castanheiro do outono
a estação do que passa e se desfaz
Esqueci a minha infância e não sei nada
Estou à sombra e espero alguém virá
sombria melodia do meio-dia
o perfume dos campos cavalgados
na quente luz do dia em que eu vivia
Alguém me chegará desse distante bosque
onde eu errei a minha juventude
nas formas levemente tacteadas pelos dedos"
excerto do poema Despeço-me da Terra da Alegria, de Ruy Belo 

Muitos dias andei longe. Melhor, dei por mim longe. Tão longe que não me identificava em parte alguma. Tão longe que não descortinava o caminho do meu regresso.

Como sempre, é na meditação das palavras que me cercam que retorno a um caminho - nem sempre novo, nem sempre velho - mas a um caminho plausível entre um horizonte indistinto e a possibilidade de relatar o hoje escrevendo o amanhã.

Na colheita das palavras - de todas as que me cercam: as já escritas; as já lidas, algumas tão repisadas!...; as que esperam ser ouvidas; as que voam perdidas, e que, sem saber, me interpelam... - encontrei esta expressão "despeço-me da terra da alegria".

Apesar de já conhecer o poema (aprecio a forma forte, sagaz e irónica de muitos poemas de Ruy Belo, poeta maior da nossa língua, infelizmente votado ao esquecimento), foi esta expressão - tão breve como infinda... - que me fez regressar, despedindo-me do "longe" e abraçando a vida, a minha "terra da alegria".

Reiterei perante mim que não quero esquecer a minha infância; que quero continuar a encontrar o castanheiro; que quero continuar - e continuarei - a viver com perfume dos campos, o canto dos pássaros e a música do vento. Porque a minha vida não é a espera de alguém e dos seus prodígios:  o prodígio da minha vida é o círculo em que a minha vida se une a tantas outras - na alegria e na liberdade.

O prodígio da minha vida  não é o que espero de alguém nem é esperar alguém... porque não quero despedir-me da terra da alegria!




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quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Da Partida (receio)

Parto amanhã. Em completo cuidado.

Ansiei pelas férias - mas sinto-te longe. Muitos dias antes de partir te sinto já mais longe.

Recebi uma proposta aliciante que me levaria para longe. Corri a ligar-te no minuto seguinte. No dia. No seguinte. Não falámos. Decidi que tomaria a decisão por mim. Calei-me dois dias. Quiseste falar. Eu matutava a decisão - não posso dizer sozinha, porque a decisão pondera sempre os outros, porque são as pessoas o meu mundo e não o salário a milhares de kms de distância. Mantive-me calada. Decidi. Resolvi a questão. Liguei-te então: parece-me que percebeste. Mas senti-te frio e distante. Ficamos a discutir a realidade angolana, no momento em que eu já não necessitava de a discutir contigo.
Disse-te que pesara muito na decisão o facto de não me querer afastar das pessoas que amo.
Nada disseste. Como se não fosse contigo. E era.

De todos as intenções de que me falaste para o período de férias, acabaste a dizer-me "podias vir até cá, para tomarmos um café. Eu gostava, até porque tens tempo livre...".
Estás cansado, exausto, sem esperança. Eu sei. Mas... é também de mim?

Hoje liguei-te. Falamos. Sobre a importância das férias, sobre a país diferente para onde viajo, sobre o que são as expectativas das férias, sobre aproveita bem, falamos quando voltares..
Liguei-te para que me dissesses estas coisas. Não houve um gosto de ti, nem um vou ter saudades.
Estás cansado, exausto, sem esperança e, mesmo antes de eu partir, já estás longe demais.

E este meu cuidado que temo que não compreendas: não te quero cobrar este afastamento, embora me entristeça profundamente. Sei que tens coisas muito mais importantes ou prioritárias a merecer a tua atenção e empenho. Mas eu ando tão só e triste...

A minha Mãe está doente. Piorou nos últimos dias mas não quer que eu deixe de viajar. A minha Irmã "rende-me" junto dos meus Pais.

Parto amanhã. Em completo cuidado.

terça-feira, 29 de junho de 2010

Da Fraternidade (criar laços)

"Tu não és ainda para mim senão um garoto inteiramente igual a cem mil outros garotos.
E eu não tenho necessidade de ti. E tu não tens também necessidade de mim.
Não passo a teus olhos de uma raposa igual a cem mil outras raposas.
Mas, se tu me cativas, nós teremos necessidade um do outro. Serás para mim único no mundo. E eu serei para ti única no mundo...
Se tu me cativas, minha vida será como que cheia de sol. Conhecerei um barulho de passos que será diferente dos outros. Os outros passos me fazem entrar debaixo da terra. O teu me chamará para fora da toca, como se fosse música.
E depois, olha! Vês, lá longe, os campos de trigo? Eu não como pão. O trigo para mim é inútil. Os campos de trigo não me lembram coisa alguma. E isso é triste!
Mas tu tens cabelos cor de ouro. Então será maravilhoso quando me tiveres cativado. O trigo, que é dourado, fará lembrar-me de ti. E eu amarei o barulho do vento no trigo..."
excerto de O Principezinho, de Antoine Saint-Exupéry

Num dos meus livros de Português - não sei quantos anos já lá vão, nem me apetece contá-los... - havia um texto em que uma Raposa explicava a um Principezinho o que significava cativar.

É com as bonitas imagens acima transcritas que a Raposa explica ao Principezinho o significado de cativar, de criar laços.

Ao longo da vida, fui relembrando estas (e outras) palavras deste fantástico livro que - ainda hoje - me lembram em palavras simples e bonitas o que é ser Amigo, o que é ser Fraterno, o que é ser para os outros para que os outros sejam para nós.

Ainda hoje tenho a certeza que somos sempre responsáveis por aqueles que cativamos. E que cativar é uma tarefa sem fim...



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Um obrigada a Antoine Saint-Exupéry por estas palavras mágicas, no 110.º aniversário do seu nascimento!



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segunda-feira, 28 de junho de 2010

Da Incerteza (medo)

"Oh minha terra
minha aventura
casca de noz
desamparada."
excerto da Desfolhada, de Ary dos Santos 

Hoje dou uma parte do "meu" poema ao desnorte do nosso país, à impotência que sinto (tão acompanhada...) perante todo o desatino que "desnorteia" tantas medidas e, infelizmente, poucas soluções!

É mesmo uma aventura viver num país tão à deriva onde não se perfila um capitão à altura da nau, à altura de tal empresa...



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domingo, 27 de junho de 2010

Do Afecto (saudade)

"Espero sempre por ti o dia inteiro,
Quando na praia sobe, de cinza e oiro,
O nevoeiro
E há em todas as coisas o agoiro
De uma fantástica vinda."

Aproveitar o Domingo para pôr em ordem a papelada... Esse era o plano... Que, como quase todos os que fazemos, tentando meter uma vida num dia, ficou pelo caminho. Sem pena!

Ao tentar guardar mais uns papéis numa gaveta já a clamar clemência, dei por mim a rever tantas pessoas queridas que ponteiam tantos momentos felizes da minha vida! Tantas saudades!

Os amigos da escola, as meninas das confidências, os compinchas das tropelias, as companhias das folgas aos professores, o bando dos "nico-picos", o grupo das passeatas... As nossas gargalhadas, os nossos disparates, as nossas anedotas, a nossa solidariedade, a nossa afinidade e disponibilidade... Um mundo!

Dei por mim a desejar ter toda esta trupe por cá...
Amigos cuja presença se foi esbatendo ao longo de 20 anos de "cada um segue a sua vida", como se as vidas fossem estanques!...
Amigos - uns de longe, outros de perto - mas que lembro com saudade, estimo com afecto e espero como milagre!

Por isso, quando reli estes magínificos versos de Sophia (são todos magníficos..., para dizer o mínimo!), decidi dedicá-los a todos estes meus Amigos a quem dedico um grande afecto apesar de, há tanto tempo, os não ver.

Ao Agostinho (o meu "se"), à Ana Paula (companheira de tanto comboio), à Zélia (a amiga da tropelia às palavras), à Elisabete (a enciclopédia das anedotas), à Paula Cristina (a amiga mais vaidosa), à Anabela (a voz de sereia), à Elsa (a nossa noiva de Maio), ao Vítor (com ele íamos às jaulas), à Lurdes, ao Manuel e a tantos, tantos outros...

Tantas as saudades... Tão bom pensar que permanecem por cá, no coração. Tão bom ter a certeza que, quando os reencontrar, o afecto continuará a ser o nosso vínculo.



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sábado, 26 de junho de 2010

Da Intimidade (prece)

"Como eu não sei rezar
Só queria mostar meu olhar meu olhar meu olhar"
excerto da cação Sou Caipira, de Elis Regina

Numa das minhas rotineiras deslocações, a rádio surpreendeu-me com a voz límpida e sentida da Elis Regina nesta fantástica canção Sou Caipira Pira Pora.

A primeira lembrança que tenho das canções de Elis Regina é de uma das primeiras telenovelas transmitidas em Portugal onde muitas vezes se ouvia Fascinação (talvez a minha canção predilecta desta cantora).
 
Mas esta Caipira em particular é (sempre foi) uma espécie de canção-hino que me emociona realmente. Acho que me identifico com a mensagem: todos nós somos obreiros de uma mina nem sempre clara, nem sempre visível, muitas vezes penosa.
E, à custa de tanta dificuldade na mina, tantas vezes nos sentimos fora dela ou aprisionados por ela. E por isso continuamos a rezar pela capacidade de colocar a vida no trem, num curso certo, claro e feliz.
 
Raramento contenho uma lágrima nestes dois versos. De facto, acredito que, por muitas que sejam as palavras, por muito engenhosa que seja sua articulação, há situações em que a palavra não consegue conter a nossa ânsia, a nossa esperança, a nossa emoção.
 
Desde criança que penso que rezar é estar disponível para Deus ler o meu íntimo, saber o que quero - mais que isso: saber o que eu preciso. Hoje, tenho absoluta certeza de que assim é.
 
Sei que tenho um Amigo - e é mesmo assim que me refiro a Deus ou a Cristo: o "meu Amigo" -, que esse Amigo é amor e que sabe melhor de mim do que eu própria.
 
Por isso, quantas vezes Lhe mostro o meu olhar. Enche os meus dias de luz saber que Ele o vê!



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sexta-feira, 25 de junho de 2010

Da Celebração (parabéns)

"Terror de te amar num sítio tão frágil como o mundo
Mal de te amar neste lugar de imperfeição
Onde tudo nos quebra e emudece
Onde tudo nos mente e nos separa"
poema Terror de te amar, de Sophia de Mello Breyner

Parabéns!

Um pequeno poema, um mar de emoção e uma esperança quase feroz acompanham esta mensagem que assinala o teu aniversário.

Falta pouco para podermos celebrar verdadeiramente.




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quinta-feira, 24 de junho de 2010

Do Regresso (ânsia)

"Como ondas do mar dançam em mim os pés do teu regresso"
excerto do poema Enquanto longe divagas, de Sophia de Mello Breyner


Penso que voltaste a mim, Amor.

Mas o meu anseio é que voltes a ti. Que reencontres o teu caminho para ti.
Só assim, creio, regressarás inteiro para mim. Para o amor - a nossa casa.

Pesa-me o teu desalento. Pesa-me a tua mágoa.
Sobretudo porque não sei como contrariar essa escuridão que te cobre, te entorpece...

Possa eu ser alento, possa o nosso amor ser motivo, possa a esperança que resiste ser certeza.
Possa o teu regresso dançar alegre em nossa casa.



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terça-feira, 22 de junho de 2010

Da Palavra (acolhimento)

"Pois a palavra não é o grito,
mas acolhimento ou despedida.
A palavra é a súmula do silêncio,
do silêncio, a súmula de tudo."


Estou a ler (correctamente: a reflectir) os Contos Exemplares de Sophia de Mello Breyner.
São fantásticos, mas não são o mote da reflexão de hoje.

O livro foi-me emprestado - é um livro já bastante manuseado por alguém que nele inscreveu outros tantos segredos: estes muito menos sondáveis que os dos Contos Exemplares. Por isso, é como se estivesse a ler, além dos contos, as confidências e os propósitos do anterior leitor.

Uma das páginas ostenta os versos que acima transcrevi - sem indicação do poema, sem indicação do autor...

Seduziu-me esta ideia da palavra-acolhimento e da palavra-silêncio!

Tantas são as vezes que não encontramos a palavra a proferir mas o nosso silêncio é um mundo de emoções e de encontro com o outro!
Tantas são as vezes que as emoções e o encontro não pedem mais do que um meigo e sereno acolhimento... A palavra? Temos os olhos, o sorriso, a expressão... poupemos as palavras!
Silenciemos nelas o nosso mundo!


Para ti. Além de tudo, tenho também a tua mão entrelaçada na minha.



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segunda-feira, 21 de junho de 2010

Da Partilha (sorriso)

Trocaria o azul límpido do céu
Pelo desejo que em ti se agiganta
E o suave toque das manhãs
Pelo revolto fogo que te incendeia
E o aconchego de cada dia claro
Pelas violentas e recônditas emoções
A que a todo o momento me instigas!
tentativa de pequeno poema, por Cravo de Carne

Esta minha tentativa humilde de poema fica muito melhor na Banda de Moebius, do meu Amigo Fran, onde comenta uma extraordinária fotografia de título "Verão".


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Da Partilha (ternura)

"Só elas são
estrelas penduradas nos meus dedos.
- Ó mãos da minha alma,
flores abertas aos meus segredos."
excerto do poema As Mãos de Eugénio de Andrade
Entre a confusão de uma semana em que, invariavelmente, há mais afazeres que horas; há mais obrigações que devoções; há mais consumições do que prazeres... lá roubei um par de horas, um abençoado par de horas redentoras.

Mesmo no momento em que o corpo expressa o seu cansaço, a mente o seu desencanto, a vontade a sua falta, a alegria o seu esmorecer... Lá furtei este tempo para dar tempo a tudo - não ao resto, mas a tudo!

Um par de horas de Sol - só nessa altura me dei conta que ele cobria tudo, bem esperto..., debaixo de um jacarandá, descortinando uma paisagem singular, em serena alegria. Uma alegria pequenina - é tanto o que nos consome! - mas uma alegria ancorada na esperança do nosso amor.

Os nossos segredos não são nossos. Eu sei. Eu calo e tu calas. Eu sei porque o faço: é tanto já o que nos impede... nomear? É os impedimentos criar, dar-lhe luz e existência... Enquanto não disser, são mais pequenos... Enquanto não disser, tenho esperança que nunca venha a dizer...
E tu? O que calas? Pressinto que uma razão não muito distante o explicará...

Neste par de horas, voltei a ti. A minha mão voltou à tua - não há outro sítio onde esteja melhor.
Sabes? Sinto muito a tua falta em muitas pequenas e grandes coisas.
Mas o que mais falta me faz é a tua mão na minha... Entrelaçando os meus dedos ou escprregando pelo punho da minha camisola.

Saberás tu a ternura com que sempre procuro a tua mão?... Mesmo quando não estás cá?


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sábado, 19 de junho de 2010

Da Despedida (clara)

"Se se estreitam as mãos, e se abraça,
não é nunca para apartar-se,
é porque cegamente a alma sente
que a forma possível de estar juntos
é uma despedida longa, clara
e que o mais seguro é o adeus."
excerto do poema Serás, Amor? do poeta espanhol Pedro Salinas

Nas minhas leituras distraídas de mais viagens que uma só semana poderia albergar encontrei o poema de Pedro Salinas do qual extraí os versos transcritos acima.
 
Não conhecia o poema. Embora a fácil analogia à vida (ou até ao terrível dito conformista "é a vida...") a forma elegante, pungente e amorosa como a fatalidade do adeus se nos revela é um bálsamo!
 
Escrito sob o mote de dois versos eloquentes e paradoxais no seu intento: "Serás, Amor, um longo adeus que não acaba?", todo o poema - estes versos em particular - são uma lição do que é um afecto imenso, do que é uma doação extrema.
 
E, talvez, não seja paradoxal pensarmos em amar como se fosse um adeus. Como se necessitássemos de ter sempre "em dia" a expressão e a forma dos nossos afectos. Expressá-los e vivê-los hoje e em todos os sucessivos hojes - os únicos momentos em que estamos seguros de o poder fazer. Amanhã, se for o adeus, tudo teremos feito, tudo teremos dito. O amanhã surgir-nos-á com saudade, com amor (ainda), mas nunca com arrependimento.

No Amor, como na vida: um longo adeus se desenha à partida.


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quarta-feira, 16 de junho de 2010

Da Escolha (trigo)

"Inflama-me, poente: faz-me perfume e chama;
que o meu coração seja igual a ti, poente!
descobre em mim o eterno, o que arde, o que ama,
...e o vento do esquecimento arraste o que é doente!"

Há dias em que todas as palavras do mundo nos parecem desnecessárias.
Há momentos em que a palavra não é capaz de nomear o sentimento.
Mas há emoções que precisam de voz!

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Do Destino (círculo)

"Que pode uma criatura senão,
entre outras criaturas, amar?
amar e esquecer,
amar e malamar,
amar, desamar, amar?
sempre, e até de olhos vidrados, amar?"
poema Que pode uma criatura, de Carlos Drumond de Andrade
 
 
Mais do que à morte, estar-se (ser-se?) condenado ao Amor.

domingo, 13 de junho de 2010

Do Sortilégio (crer, ainda)

"... Chansons
Et soleil sur nos amours
Ça vient sans qu'on y pense
Soudain ça recommence
Et rien, rien n'est jamais perdu d'avance
Sans bruit ça se prépare
Et puis sans crier gare
Ça vient quand on n'y croyait plus"
excerto de Ça vient quand on n'y croyait plus, de Charles Aznavour


sábado, 12 de junho de 2010

Da Melancolia (amor, ainda assim)

"e ao anoitecer adquires nome de ilha ou de vulcão
deixas viver sobre a pele uma criança de lume
e na fria lava da noite ensinas ao corpo
a paciência o amor o abandono das palavras
o silêncio
e a difícil arte da melancolia"
poema de Al Berto

O poeta do desassombro e o desassombro da mal compensada alegria...

Um poema que começa por prometer o mundo e termina num mundo despido - incluisive das palavras - embrulhado numa pacata melancolia - entre o doce (do paciente amor) e o vazio (da constatação do frio da lava).

Todas as esperas são uma imensa possibilidade, todos os planos uma quase certeza, todas as palavras são pontes, todos os gestos são partilha (são os meus? são os teus?), todas as expressões são de maravilha...

Em todas as esperas sonhamos - enquanto arrepiamos um insidioso "se" - a perfeição. E em todas as realizações nos espera um quê de desilusão, que nos impossibilita saborear as pequenas parcelas de perfeição, misturadas com outras de decepção e com outras ainda de redenção...

Quanto mais mundo esperamos - e quem sabe se nessa espera colocamos, de facto, todo o nosso talento de oleiro e a nossa maleabilidade de barro - mais esse mundo (não deixando de ser mundo!) fica aquém daquele que esperamos...

Escrevia João de Deus "Sei o que vai em teu seio cheio de mal compensado amor" (excerto de Os Olhos Falam) - não sei se porque amamos demais, se porque achamos que o nosso amor é maior (duvidosa constatação!), se porque o amor do outro é menor (consequência da anterior), se porque não somos capazes de perceber que essa é a capacidade do outro nos amar e, sendo-a, cabe-nos a nós aconchegá-la...

De uma espera tão ansiada, que tudo prometia, não creio que tenha enchido "o seio de mal compensado amor"... Mas a melancolia... ficou por cá!

Sempre à espera de ser expulsa em forma de terna alegria.

E, assim, continuo a esperar.

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Do Querer (ser)

"Pecado, Amor? Pecado fôra apenas
não fazer do pecado
a força que nos ligue e nos obrigue
a lutar lado a lado."
excerto do poema Somos de Barro de Sebastião da Gama
Hoje é um dia especial para mim.
Não creio que existam dias de tudo ou nada, mas creio que existem momentos que mudam a nossa vida. Todos, de alguma forma, mudam ou moldam a nossa vida, acho. Mas há momentos que, de facto, mudam a nossa vida. E hoje espera-me um deles.
 
A bem da verdade, devo dizer que toda a frase "momentos que mudam a vida" está errada.
Dá-nos ideia da importância vital do que planeamos (como se se planeasse a vida...!) ou do que esperamos (mais a espera que o plano...), mas está errada.
 
Será, julgo, o que fazemos nesses momentos - a verdade e a coragem que neles manifestamos - que será capaz não de mudar a vida, mas de alinhar (e manter alinhada...) a nossa trajectória por aquilo que profundamente somos nós.
 
Hoje, espera-me um desses momentos: um momento planeado, ansiosamente aguardado, no qual deposito uma esperança imensa... Conheço-me, embora me confunda ainda - tão amiúde!... Tanta espera, tamanha esperança... Como diz o poema "somos de barro": seremos nós a moldar o momento...
Um pelo outro. Nós por nós.
 
Eu, que trago sempre as palavras (coitadas...) em rebuliço e em confusão, saberei mais logo dizer-tas? Saberás tu ler o que o meu rosto já diz tão descaradamente?
Saberei eu escutar-te e, escutando-te, saber de ti que constróis um nós?
Saberei eu ver no teu rosto a forma que o nosso barro toma, a forma como nos preparas para a luta, para o hoje e para todos os hojes que se sucederão?...
 
Tantas dúvidas a acicatar a esperança!...
 

quinta-feira, 10 de junho de 2010

Do Querer (pátria)

"queria de ti um país de bondade e de bruma
queria de ti o mar de uma rosa de espuma!"
pequeno poema (mas grande mundo...) de Mário Cesariny
Dia de Portugal.
É feriado, mas despertei cedo. Como se fosse um normal dia de trabalho - por rotina, acho... Ou seria porque até dormindo sei que estamos a levar este país por um caminho errado e, isso, esmorece qualquer vontade de comemoração? Quase de vergonha impotente e inútil (porque não é acção, não constrói)?

Chovia - chove ainda - copiosamente... Céu escuro... Nem a Natureza parece feliz por este feriado. Nem a Natureza parece disposta a festejar Portugal e os Portugueses que vivem pelo mundo...

Sentia-me gelada... Lá enfiei novamente o casaco e as meias...
Mas ainda assim... varria-me uma aragem agreste, pungente...
O meu país: o único que vou conhecendo e desconhecendo; o único que me recebe, que me surpreende, que me desilude, que me tira - tantas vezes! - do sério, que me emociona...

Mas o que é o "meu" país? É uma terra cheia de recantos e encantos, é um legado de sabedoria e cultura, é uma herança de maravilhas naturais, é um povo acolhedor e pacato, é um riso mal contido subjudgado ao peso dos dias...
O meu país é todo este legado que nos confiaram, esperando que dele cuidemos e sejamos capazes de o passar às gerações vindouras em todo o seu esplendor.
Nós somos inquilinos deste país. Como o iremos passar aos que nos sucederem?...
Tenho receio da resposta... Melhor, não quero pronunciar a resposta. É como se, enquanto a palavra não for dita, não exista.

Tem de haver uma forma de transformar este dia tão triste no dia da nossa pátria. Tem de haver...
Procurei nas memórias de palavras que andam cá pelo meu espírito (uma confusão!...): encontrei estes versos de Mário Cesariny.

(Há uma editora cujo site abria com a declamação destes versos. Hoje já não é assim e, quando entro, parece-me sempre que já não sou bem-vinda: já não me espera esta saudação, a singular declaração de que eu poderia ser pátria...)

E estes versos porque definem uma pátria que todos podemos ser. E, sendo pátria, também poderemos ter.

O nosso mundo não são palavras - mas são as palavras que levam o nosso mundo aos outros, são as palavras que nos aproximam, são as palavras que nos podem fazer - cada um à sua medida - o nosso mundo.

Uma pátria como a que sonhamos: de bondade, de mistério, de partilha, de riso... suave como o perfume da rosa; clara e delicada como a espuma; imensa, perene e criadora como o mar!

Esse mundo começa em nós.

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Do Querer (segredo)

"Mal fora iniciada a secreta viagem
um deus me segredou que eu não iria só.

Por isso a cada vulto os sentidos reagem,
supondo ser a luz que deus me segredou."


poema Inscrições Sobre as Ondas, de David Mourão-Ferreira

A felicidade de acreditar que fomos criados para a Alegria!

Como deve ser maravilhoso viver nesta plena certeza que há alguém que sempre protegerá, mitigará ou partilhará a nossa solidão!

Momentos destes - espero que todos, como eu, já os tenham sentido. Mas viver nesta imensa esperança...
Ah! Como seria bom...

Sobressalto abençoado!
Todas as manhãs, todas as tardes, todos os crepúsculos, todas as ruas, todas as vielas, todos os lugares óbvios ou recônditos vistos pelos olhos de quem espera o sortilégio...
Pensamento, coração, sentidos, emoções sempre alerta para receber o esperado...

Neste segredo - a luz virá - se ergue a esperança, se funda a certeza de ser; se funda a racionalidade da existência.

E, nesta certeza que é a espera (só a espera até que chegues...) o quanto já se está acompanhado!

Da Ternura (sempre)

"Nesta curva tão terna e lancinante
que vai ser que já é o teu desaparecimento
digo-te adeus
e como um adolescente
tropeço de ternura
por ti."
um imenso poema de Alexandre O'Neill
Quase parece um poema de adeus, não é?
Mas é muito mais...

A plena consciência - a amorosa consiciência - do espaço que o outro vai deixar vazio é a própria consciência de que se ama. Não de "quanto" se ama: ou se ama ou não...
Não há cá amo-te "muito" ou outras declinações quantitativas... Admito um "amo-te tanto..." (já a raiar o excessivo) como que significando "não tenho como te exprimir o meu amor", mais que isso é tirar profundidade à espressão verbal desse sentimento...

Um "amo-te" não precisa de adjectivos, que qualificativos, de quantificadores e de outros retoques.
Amo-te.
É um grito - seja no sentido literal, ou um sereno e expressivo sussurro. Avassalador. Não deixa dúvidas. Não admite meias-medidas.
É. E basta - tanto!

Voltemos ao poema. Aprecio particularmente a economia de meios destes poemas de poucas letras onde cabe o nosso mundo, onde cabe o também o  mundo do outro que abraçamos na vida.
Um espelho que sintetiza e nos revela o nosso mundo, envolto em diáfana ternura - como tudo o que construímos em sólidas fundações (liberdade, verdade), num espaço sempre aberto mas resguardado pelo nosso peito.

Viver o hoje como se não houvesse o amanhã. Valorizar o que temos, reverenciar, amar, proteger... Uma atitute sã, prudente - o amanhã, o daqui a bocadinho... são tão incertos! -, zelosa e amável para com a presença do outro... Afasta, certamente, a curva onde nos afastaremos dele... Permite-nos "tropeçar de ternura" (expressão incrivelmente bela, incrivelmente tocante) e ficar...

Tão bom quando a curva que nos há-de separar vai ficando mais longe, enquanto percorremos um caminho onde tropeçamos em carinho, em afecto, em amor.

E é assim que entendo este poema: não um adeus, ou uma certeza de um adeus.
A certeza de termos de continuar - e continuaremos - a cuidar da ternura.

terça-feira, 8 de junho de 2010

Do Ser (escudo)

"Começas a vestir-te, lentamente,
e é ternura também que vou vestindo,
para enfrentar lá fora aquela gente
que da nossa ternura anda sorrindo..."


excerto do poema Ternura, do livro Infinito Pessoal, de David Mourão-Ferreira

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Da Esperança (sinal)

"Se aqui de um manso mar meu fundo indicio
Três ondas o apagam"
excerto do poema Inultimente Parecemos Grandes, extraído do livro Odes, de Ricardo Reis
A minha Irmã, que regressou da Ericeira, trouxe-me um pequeno farol, azul e branco. Um mimo.
Quando regressei a este espaço, dei de cara com o farol que o blog exibe (e que já estava num formato pronto a usar...). Daí à palavra de hoje o espaço foi curto!

No meu imaginário vagueiam algumas imagens romantizadas de faróis, faroleiros, de naufrágios e prodígios... Fácil é chamar o mistério, o portento,... as coisas que não conhecemos de facto, mas que queremos à viva força que existam. Todos nós desejaríamos um conto de fadas...

Mas não é por aí que rondam os meus pensamentos em torno desta palavra farol.
Os meus pensamentos vagueiam pela luz! Pela luz que se acende em cada farol, pequenina, bruxuleante e se propaga firme e útil milhas adentro dos oceanos, iluminando vidas: segurando rotas, afastando perigos, trazendo à luz o que é da luz.

Todos nós somos faróis. Todos nós temos esta capacidade esplêndida de sermos referência de nós, referência para os outros. Seremos faróis para os outros pela nossa forma de viver, pela nossa atenção e disponibilidade, pelos nossos gestos quotidianos em prol do afago de quem nos está próximo.

Como os faróis, temos de cuidar da nossa luz, para que ela sempre brilhe e cumpra o seu papel. No nosso caso: uma missão de bem-fazer, uma missão de amar.

domingo, 6 de junho de 2010

Da Promessa (solidão)

"Quero viver como se o meu tempo fosse ilimitado. Quero me recolher, me retirar das ocupações efêmeras. Mas ouço vozes, vozes benevolentes, passos que se aproximam e minhas portas se abrem..."


Rainer Maria Rilke, citado aqui
Sou de alguém que aprecia muitíssimo Rainer Maria Rilke.
Por isso, hoje procuro o meu mundo em algumas palavras de Rilke. Todas as que conheço, magníficas!
 
Primeiro nesta pequena citação, tão complexa, como complexo fazemos o nosso dia a dia. E, visto daqui, até parece simples: viver como se o tempo fosse ilimitado - é a forma como vivemos a nossa vida, como se o amanhã fosse certo. E tão incerto que ele é!...
Soubessemos isso e o beijo não ficaria para amanhã, e as palavras ardentes (o amo-te, o perdoa-me, o vem, o quero-te) e as palavras ternas (o gosto de ti, o desculpa-me, o estou aqui) seriam pronunciadas na altura certa - que é toda - e nunca tardiamente, quando já não têm o dom de mudar, de construir mundo.
Soubessemos isto e deixaríamos de ter relógio, passando a ter tempo; deixaríamos de ter agenda, e passaríamos a ter afectos...
 
Destrinçar entre o que é importante e o que é acessório. Sim, porque podemos ter estes e aqueles afazeres, mas se nos perguntarem o que é importante para nós, os afectos virão à cabeça da lista. Então, porque os adiamos?
 
Porque não dizemos às nossas crianças que irrompem casa dentro em grande euforia um "vou brincar contigo" e preferimos alertá-las para uma qualquer obrigação que não cumpriram?
 
Porque não dizemos aos nossos Pais o quanto são para nós, preferindo ignorar os seus reiterados queixumes e lamentos?
 
Porque não dizemos à pessoa que partilha a nossa esperança que ela é também a razão dessa esperança?
 
É de Rilke (julgo) a seguinte frase:
"Amor são duas solidões protegendo-se uma à outra."
Hoje, aqui, te digo: tu proteges a minha solidão. Oxalá eu consiga proteger sempre a tua.

sábado, 5 de junho de 2010

Do Querer (mais)

"O meu país sabe as amoras bravas no verão.
Ninguém ignora que não é grande,
nem inteligente, nem elegante o meu país,
mas tem esta voz doce
de quem acorda cedo para cantar nas silvas."


Excerto do poema As Amoras, de Eugénio de Andrade
 
Não gosto de futebol. Não gosto dos pseudo-deuses que cria. Não gosto dos desmandos que alimenta e de que se alimenta. Nem sequer gosto de vuvuzelas!
 
Abro uma excepção para o hino deste mundial - gosto! Gosto especialmente do clip (no meu tempo, no tempo dos primeitos clips, dizíamos telediscos... ainda me acontece dizer - ou não sabem, ou fico logo no rol dos mais velhos, ternamente (?) apelidados de cotas...) que revisita todo o nosso imaginário de África (encontra-se aqui). Anima!
 
Ordem! Não gosto de futebol nem da parafernália que o envolve e que tudo envolve - esquecido tudo o que é relevante até... até que corra tudo bem.... ou... até que corra tudo mal!

Para o país - e este somos nós: os de hoje, os que deixaremos cá depois que partirmos - irá correr mal.
Subjugados por uma estranha alegria e motivação - a primeira de fachada, a segunda inútil e fútil - seremos espectadores de um jogo que nos alheará do jogo importante, do jogo que é o futuro do nosso país.
 
Mas agora me lembro: se não houvesse esta distração, estaríamos condenados à tragédia de assistir impotentes (!?) ao agonizar do nosso país, das nossas gentes, enquanto os iluminados, ledos e serenos, alguns (que elegemos!!) seguem assobiando, propalando maravilhas e reformas no nosso país - que, por mais que se queira (à custa do cansaço de tanta angústia!), não se conseguem descortinar.
Talvez esta pausa seja útil... A seguir virão as férias de Verão...
 
E é assim que chegamos a este país tão sábia e meigamente retratado nestes versos de Eugénio de Andrade - até se chega a pensar que nele se fala bem de nós próprios - vivemos bem sem a elegância (é nestes momentos que dizemos que o aspecto não interessa, interessa é o interior...), sem a grandeza dã não (interessa ser grande em princípios, não em tamanho ou em valores materiais...). E quase nem nos importamos de viver sem a inteligência... Como se isso fosse possível!
 
Continuamos a ser doces... Só não sei se acordamos cedo. Nem se continuamos a cantar as silvas.
 
Mas somos um país, maioritariamente, de heróis. Daqueles a quem ninguém condecora, mas que fazem o milagre de governar uma casa com o salário mínimo, criar um ou dois filhos, pagar os transportes para o emprego e continuar a sorrir, mesmo quando se vão subtraindo a esse salário impostos, uns atrás dos outros...
E se fica com a vaga noção que se destinam a uma heróica viagem à África do Sul, à Venezuela, à China, ou a outra parte do mundo qualquer.  
Heroismos que nunca lhes (nos) caberão...

Uma viagem a que assistiremos, em apoteose, pela caixa que nos traz o mundo a casa - de frente, de perfil, de cima,... tantas vistas quanto as acrobáticas posições dos repórteres permitem. Devidamente legendadas, relatadas e comentadas por jornalistas, comentadores, painelistas (!) e sabe-se lá mais quem... Cá na terra, são so reformados que assistem aos trabalhos na via pública - chamamos-lhes os "engenheiros"; nos meios de comunicação social, são tudo e mais alguma coisa.


O que mais me custa é a expressão "líderes de opinião": agradeço, mas não quero. Por opinião quero a minha. Informem-me e eu formo-a.

Assim... continuam a caber-nos as silvas... Desde que as cantemos manhã cedo!
 
O meu país não se governa - não há quem o sirva. Não há quem o queira governar.
 
Mas é um fado cantado, suavemente, junto às silvas.... E o fado começa assim "É a vida...".

Ai, como gostaria de abanar o meu país! E dizer-lhe que
"filho de um rei, que estando velho, volta a nascer quando há calor!"

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Do Amor (ser muito mais)

"basta a tua presença que protesta
e todo eu me sinto renovado"
de Poema para a Catarina, de Ruy Belo
Para ti, que voltas.
Que trazes tempo ao meu tempo, mundo ao meu mundo.

Não me tinha esquecido, como poderia?!
Não me tinha esquecido da poesia e da promessa - ou da promessa e da poesia - que fomos partilhando... Não me tinha esquecido, fazias-me falta todos os dias, todos os momentos...

Tantos já o disseram, mas são mesmo essas as palavras: eu não era eu completamente. Por que deixei de ser só eu quando te conheci. Passei a ser mais eu... Contigo e por ti.

Mas, agora que voltas, volto a ser eu, o eu a que me habituei nos últimos onze anos (tinhas notado que percorremos tanto tempo?!...) e que, nos últimos tempos, não conseguia encontrar: não estava no espelho, não se deitava comigo, não me respondia quando me interpelava... Não era solidão, não era desânimo - era vazio, ventoso vazio que sempre me gritava a tua falta.

Volto a ser eu, completa. Eu e tu e, entre nós, por nós, de nós, as nossas palavras: as proferidas, as sentidas, as pressentidas, as sussurradas, as prometidas... De nós. Na poesia deste afecto imenso.

Tenho medo... Não sendo um mas, aqui testemunho o meu medo - não posso perder-te outra vez.
Não, não é "não quero perder-te"; é mesmo não posso.

quinta-feira, 3 de junho de 2010

Da Alegria (amor)

"E o deslumbrante resplendor da alegria
tua felicidade eterna à vida
já não permitirão tua partida
quando raiar fatal o novo dia"
excerto do Poema para a Catarina, de Ruy Belo
Porque hoje, ao contrário do Poeta, regresso à terra da alegria, à esperança no amor do meu Amor.
Reconcilio-me com a certeza do meu amor pelo meu Amor.

quarta-feira, 2 de junho de 2010

terça-feira, 1 de junho de 2010

Da Esperança (mais mundo)

"A esperança é um dom que eu tenho em mim (eu tenho sim)
(...)
Tem um sonho em minhas mãos
Amanhã será um novo dia
Certamente eu vou ser mais feliz."
excerto da canção Era uma brincadeira, escrita por Peninha, interpretada por Caetano Veloso
Tirados de uma canção que reconhece uma partida, estes versos são um oásis.

Ter um sonho é motivo bastante para ter esperança. Porque o sonho é nosso, enche-nos, mesmo quando somos tentados ao vazio da falta de alguém que parte.

E por isso, o sonho motiva-nos a persisitir na vida - a nossa esperança reside em nós próprios: na consciência que há um tempo infindo para lutarmos pelos sonhos, mas breve (amanhã!) para entendermos a sua realização.

E, nesta conjugação - perda, sonho, luta, realização - perpassa a esperança e consubstancia-se a alegria!

Muito simples, como todas as coisas importantes da vida!

Da Luz (sonoridade)

"Não há céu de palavras que a cidade não cubra
não há rua de sons que a palavra não corra
à procura da sombra de uma luz que não há."
extraído do poema Partilhar de José Carlos Ary dos Santos (também aqui)

Palavras intrigantes!

As palavras como céu, cobertas pela cidade. Então, a cidade não está assente no chão e o céu assente, digamos, no céu?

Um céu de palavras... Imagem tão extraordinária! A liberdade, a infinita possibilidade de ser (tudo!), a estonteante capacidade de se soltar e dizer sem pejos as palavras que espontaneamente nos brotam e que tolhemos antes de cumprirem a sua missão...
Somos nós que as calamos - mas é mais fácil aceitar que é a cidade que as cobre... Porque a cidade não sou "eu", mas a cidade somos nós nesta intrincada teia de relações que nos fazem ser o que parece bem e não ser aquilo que temos de ser.
Somos nós que as calamos - pensando que construimos relações, quando muitas vezes nos deixamos levar por uma corrente que não dominamos, num rio que desconhecemos, entre as paredes de cidades que não são abrigos mas sim amarras. Não são relações - porque não são espaço de liberdade. Pronto.

Mas há palavras que continuam a ouvir-se alto! Contra a indiferença, contra o comodismo, contra o politicamente correcto. Há? Sim... as palavras que, mesmo nas ruas de som (de ruído?) se fazem ouvir, temerárias e lancinantes...
Mas quem as ouve? Quem lhes dá vida depois de escutadas?
Muito temos a fazer... Porque essas palavras miraculosas atravessam as nossas vidas assoberbadas de outras palavras inúteis - mas que ocupam muito espaço, gastam muita energia, entretêm muito tempo - sem trespassar a nossa indiferença, sem motivar a nossa mudança, sem encontrar eco que as faça viver, sem encontrar ânimo que as faça ser.

E, assim, se perde a esperança e se tolhe o futuro - porque os perdemos à procura de uma sombra, quando nem a luz existe.

domingo, 30 de maio de 2010

Das Rosas (silêncio)

"A palavra sarcasmo é uma rosa rubra.
A palavra silêncio é uma rosa chá."
extraído do poema Partilhar de José Carlos Ary dos Santos (aqui)

Gosto tanto destes versos. Ao contrário de muitos outros, não os consigo separar. Sempre que tento reduzir a imagens menores, há algo que falta, há nos que selecciono uma mensagem clara alertando para a mutilação. E, às vezes, a mensagem é gentil - quando faltam as rosas rubras, mas muitas outras a mensagem é uma ventosa interpelação - porque faltam as rosas chá.
As rosas rubras são mais ariscas a pedir o que lhes falta... será que, até elas, sabem que lhes falta a ternura?...

E isto sempre me lembra da necessidade do equilíbrio - não se concebe (embora se deseje) um mundo rosa chá, porque o sal da vida está, claro, nas rosas rubras.

O problema é que, não conseguindo separar estes versos, estes, em conjunto, são um mundo que me permitem apenas uma interpretação limitada - ainda mais limitada do que as outras, quero dizer!.

Acho particularmente desafiante a imagem do sarcasmo enquanto rosa rubra. Como ligamos esta última ao Amor (a rosa vermelha, a rosa escarlate, a rosa encarnada, a rosa rubra, mas sempre a rosa-sangue-pulsante...), contagiamos o sarcasmo (arma tão subtil quanto cruel...) com toda a fertilidade, não do amor, mas pelo menos da paixão.

E talvez não sejam as palavras amenas que nos incendeiam - talvez sejam estas, as cruéis, que desencadeiam em nós revoluções, erupções, incontroláveis e desmedidas emoções. As verdadeiras, as que não intelectualizamos. E, digo, serão essas as rosas rubras que permitem a nossa evolução - interior, em relação ao outro, em relação ao mundo, ou mesmo do próprio mundo.

E a palavra rosa chá? Será "só" o silêncio? E pode o silêncio ser "só"?
Esta é uma imagem magnífica! Apresenta-nos o conforto (chá), a cumplicidade (silêncio), a ternura (não a alvura do branco, mas a placidez da cor de rosa chá), a partilha (da rosa, o aroma).

A palavra leva o nosso mundo ao outro - seja esse outro quem for.
E o nosso silêncio leva o nosso mundo ao "nosso" outro. O nosso silêncio é o espaço de ternura, de amor em que eu e tu vivemos. Só nós. Só nós - eu e tu - que partilhamos este silêncio, trocando esta rosa chá.

Magnífico!

Para ti. Que conheces o meu silêncio que, de ti, cobra sempre, sempre muitas palavras.
Por mais silêncio que receba...

sábado, 29 de maio de 2010

Da Sementeira (futuro)

"há palavras imensas, que esperam por nós
e outras, frágeis, que deixaram de esperar"
excerto do poema You Are Welcome to Elsinore de Mário Cesariny (também aqui)
Novamente o Poeta da Liberdade - da liberdade de ser, quero dizer. De ser o real, o irreal e o que entremeia e fica ainda além dos dois. Pois... surreal.

Gosto muito deste poema (soa banal - se fosse em inglês diria "I love this poem" - estaria perfeito: nem banal nem exagerado como soa em português "amo este poema"); da forma como todos os seus versos per si são já poemas; da forma como podemos conjugar os seus versos continuando estes a ser poemas; da forma como podemos extrair um pedacinho e este continuar a sê-lo per si, mesmo que não indiquemos onde o mesmo se encaixa.

Destes dois versos em particular - construídos, é bom que se note, apenas com palavras de todos os dias, do supermercado, das compras do mês, da escola das crianças e até da nossa conversa afectada de certos dias... - se retira o círculo em que levamos a nossa vida. Círculo porque segue seguindo, sem sabermos onde foi o início e sem antevermos o final. Uma confortadora ilusão de perpetuidade.
No primeiro verso, o futuro: cheio de promessas (porque nos esperam), cheio de prodígios (porque imensas), porque nos trazem aquilo que já hoje queríamos e por isso tão ardentemente esperadas; no segundo... não, não é de perda que se fala!
(Lembram-se que aqui tratamos as palavras que criam mundos?...)
O segundo verso é um amoroso alerta: que o futuro - a esperança - não nos deve tolher o presente, semente desse futuro. Porque as palavras imensas que esperam por nós brotam das frágeis que hoje vamos proferindo - não nos podemos esquecer de as dizer, para que elas não se percam, não desistam de nós.

Por causa desta re-leitura (embora as saiba de cor, gosto de ver o seu contraste na folha de papel; é como se ao vê-las no papel eu veja ainda, sempre novas, imagens e correlações que não sugem da mera rememorização das mesmas), fiz o que devia ter feito há muito tempo: enviei uma sms a alguém que amo dizendo-lhe isso mesmo (em português, porque é mesmo amo-te que quero dizer e não o esquivo I love you). Espero ter sido uma palavra do presente a frutificar num imenso futuro.
Havemos de saber.

Da Alegria (bálsamo)

"Prazer de renegar e de destruir o tédio,
Esse estranho cilício,
E de entregar-me à vida como um vício."
Excerto de Alegria, poema de D'Aquém e D'Além Alma de Fernanda de Castro (aqui)

Gosto tanto da fortuna que esta Poetisa nos legou!
Não preciso de dizer aqui da sua obra, da revolução das suas palavras, da inovação da sua mensagem, da sua singular vida... Acho que, muito faltando para dizer (nunca se dirá tudo...), outros estão, de facto, mais habilitados para o fazer.

Mas preciso de dizer aqui o muito que a mim, particularmente, legou.
A começar pela compreensão desta Alegria, inerente à vida, a que cada vez presto mais atenção - à vida enquanto génese, à alegria enquanto paradigma de vida.

Sendo, por si, uma palavra radiosa, quase contagiante (uma palavra amarelo-girassol ou azul-turquesa) só consegui dar-lhe o poder que tem sobre a vida quando, há uns anos já, li este poema, do qual excertei os dois versos acima (tão reveladores como quaisquer outros do poema - escolhidos apenas pelo seu poder de síntese).

A descoberta foi motivada por um dito da Poetisa: "eu estou sempre comigo, nunca estou sou" (não é citação literal). Longas semanas matutei nisto. É uma observação estranha, não é?

Até então, sempre que me encontrava sozinha com os meus pensamentos (com a minha própria companhia) encontrava-me em profunda, desoladora e penosa solidão. Mas eu estava errada. Nesses momentos era - é - quando estou comigo de forma mais plena, mais consciente de mim e a emoção mais inquietante que surge não é a solidão: é a saudade. A ânsia de, além de me ter, ter mais alguém comigo.

Parece a mesma coisa? Não é! Definitivamente, não é.
Não significa também que eu me baste, nem significa que a minha companhia é mais (ou menos...) que a dos outros - significa que me dou momentos de maior intimidade comigo e, nesse sentido, me conheço e vou reduzindo a capacidade de me dispersar, de me desagradar, de ser aquilo que não quero ser.

Esta Alegria surge na sequência - aceitar-me, ser para mim a minha primeira prioridade (só sendo eu, posso ser para os outros em plenitude), saber-me sempre em companhia é já motivo de alegria.

Saber-se que se vive - e a vida é a única realidade positiva que, de facto conhecemos (por contraponto com a morte) - e saber que, a cada experiência vivida, se compõe importantíssimo património para vida futura ainda mais vida é, certamente, grande Alegria.

Encarar-se o agora - por mais vulgar, rotineiro ou sofrido que seja - como a espera das surpresas do amanhã é... um bálsamo. Uma Alegria.

Onde quer que viva hoje, certamente em Alegria, aqui lhe deixo um agradecimento sincero e comovido por esta dádiva!

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Do Ser (muito mais)

"O que és não vem à flor
Das caras e dos dias"
excerto do poema "Faz-me o favor.." de Mário Cesariny
E, depois deste interregno (diria quase de luto*), volta-se à alegria das palavras prenhas de sentido, de sentimento... Que quase explodem de vida e mendigam atenção.

Sem pejo - permita-me este Poeta da Liberdade - retiro do fantástico poema apenas estes dois versos. Eles  são já uma ode ao conhecimento profundíssimo que um tem do outro (pode ser amor, pode ser amizade, não interessa - até porque são sentimentos que não se desunem), mas é tão ampla, tão portentosa e tão reveladora que só grandes imagens (como estas) retratam - e, ainda assim, ficam aquém!

Mas também podem ser uma evidência da diferença entre o que se é e o que se mostra. E isto não é ter "duas caras" (lembrem-se que o objectivo é buscar palavras que criam mundos!).
É não ter dias para ser aquilo que se é - tão mais do que o que permitem as traiçoeiras rotinas em que se entretêm os dias.

Imagino estas palavras ditas por alguém ao seu par - de mansinho, constatando que o outro é tão mais que aquilo que os outros (que importam?) se apercebem... E, na imensidão dessa descoberta (que se refaz, sempre em redrobrados desvelos) ambos se espraiam por entre as flores, penetrando nas caras, nos dias sabendo aquilo que os outros não sabem.

Uma imagem comovente da cumplicidade da partilha de um segredo - que é o mundo do afecto que une as pessoas.

Tão bom...!


* E, contudo, parece-me impossível fazermos o luto de uma pessoa viva. De Alguém a quem não conseguimos resgatar o pedaço de coração que nos continua a ocupar.
Porque, se os inúmeros momentos de alegria, companheirismo, cumplicidade podem ser lembrados com carinho, com o sorriso fértil da palavra Amigo, já o futuro (e o presente, vá...) sem este Amigo que permanece no coração, no afecto, parece (o futuro) que nos afronta com a evidência da inutilidade do espaço que foi a nossa amizade.
Nunca consegui entender isto. Recuso-me a entender. Recuso-me a aceitar que o espaço do afecto fraterno se torne estéril.
E, deste tema, ficamos conversados!

domingo, 16 de maio de 2010

Do Sofrimento (adeus)

"Faz-me o favor de não dizer absolutamente nada!"
excerto do poema "Faz-me o favor..." de Mário Cesariny (aqui)

Ainda este abominável sentimento de perda... Da falta. Do adeus, que o não deveria ser, que o não precisava ser.
Tão profundo, tão sentido... Quase palpável.

Melhor, como diz este (dos meus) Poeta, o melhor será não dizer nada.

Amanhã, provavelmente, enquadrarei alguma palavra deste maravilhoso poema num maravilhoso sentimento. Na maravilha que é o mundo deste Poeta (criando os mundos de tantos...). Daqueles sentimentos que normalmente povoam o meu espírito.
Hoje (e já são 17!) ainda não é possível.



sábado, 15 de maio de 2010

Do Sofrimento (adeus)

"Amanhã fico triste… amanhã!
Hoje não… Hoje fico alegre!
E todos os dias, por mais
Amargos que sejam, eu digo:
Amanhã fico triste, hoje não…"
Poema encontrado na parede de um dos dormitórios de crianças do campo de extermínio nazista de Auschwitz

Sem comentários.

quinta-feira, 13 de maio de 2010

Da Memória (eternidade)

"Sangrentas são as palavras e deixam rastos através dos tempos"

Herberto Hélder (aqui)

Li estas palavras há pouco.
Ainda não me refiz do soco no estômago.

Repito cada palavra: "são" (forma do verbo ser no presente do indicativo - nada de especial...); "as" (artigo definido no meu tempo de escola, hoje determinante; nada de mais...); "palavras" (outra cuja classificação morfológica se alterou de substantivo comum para nome comum; e não deixa de ser uma palavrinha comum, inóqua!); poderia continuar: não vale a pena. Uma sucessão de palavras quotidanas.

Ah! Notaram que me esqueci do "sangrentas"...
Ora ainda bem. Também penso que aqui reside a chave para se apreender - imediata, instintivamente - a força abrupta desta frase. 

Que palavras são estas - as sangrentas? As que proferimos com raiva, com ódio? As que materializam injustiças? Ou as que prendemos na garganta e que fariam toda a diferença contra a violência que povoa a vida dos outros? As presentes ou as omissas?

Mas... Será que "sangrenta" é uma palavra de guerra, de ódio? Dizemos que sim e lembramos: Noite Sangrenta (revolta de 21-10-1921 em Lisboa), Terra Sangrenta (filme sobre o conflito no Cambodja na década de 1970), entre muitas outras expressões que ensombram as nossas memórias e a nossa história. Justamente. Porque estas situações reflectem o que há de pior no Homem.

Mas não haverá - mesmo - uma forma de redimirmos esta palavra? Voltemos à frase de Herberto Hélder: parece que tais palavras deixam rastos pelo tempo. Talvez esteja aqui a pista: o rasto que se deixa através dos tempos permite a imortalidade dessas palavras. Imortalidade é bom, não é? Pois...

Então, as palavras sangrentas (sendo que sangue é o que nos corre nas veias, quantas vezes acelerado por tantos sentimentos e ânsias - na esmagadora maioria, quero crer,  benignos) contêm em si próprias uma corrente (sanguínea) que transporta de geração em geração aquilo que imortalizamos. Só morremos quando somos esquecidos.

As palavras marcam-nos: as que dizemos e as que omitimos; as que ouvimos e as que se calam. Mudam vidas. Constroem ou destroem vidas. O seu rasto é inevitável. Têm sangue - não necessariamente porque ferem - mas porque é esse sangue, esse pulsar que as mantem vivas e úteis.

Parece-me que já estou melhor... do soco, digo!

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Do Espaço (fértil)

"em cada esquina um Amigo"

in "Grândola, Vila Morena", de Zeca Afonso (aqui)


Num início de dia atribulado (duvido que haja palavra apropriada a acordar o sono que corre solto...), entre o corre-corre de tarefa em tarefa (pelo meio deixando as perfeitamente dispensáveis, ainda assim repetidas nos dias do vagar), o perder o comboio e apanhar o táxi... lá surgiu a palavra do dia.
"Corra até àquela esquina, há táxis logo ali!" Ainda há gente simpática, pensei.Quase no meu destino - a horas, que alívio! - rememorizei a ajuda. Esquina... Esquina...
Lentamente a esquina era música e palavras de uma canção.

"Em cada esquina um Amigo" - fora mesmo isso que acontecera. Na esquina de um dia, surge o Amigo que dá o conselho útil, oportuno. 
Na esquina faz-se Amigo - só por estar lá, atento (como os Amigos, diria). Nem sempre o vemos, porque dobrou a esquina.

Lembro-me de outras esquinas: aquelas que ultrapassamos em silêncio, quase em segredo, e nos permitem desbravar novos mundos, novos afectos, crescendo nós também. As esquinas da nossa mente, as esquinas que escondem as nossas alegrias e as nossas tristezas, como se fossem realidades bipolares.
Quantas vezes verdadeiras vias férteis! Quantas vezes vias dolorosas!

O caminho esquinado em torno desta palavra traz-me a lembrança de que ontem, mesmo ontem, perdi um Amigo. Perdi-o, apenas, numa esquina da vida. Eu segui em frente, ele dobrou a esquina.
Não quero pensar que não o encontrarei em mais nenhuma esquina (embora saiba que é isso mesmo que vai acontecer - provavelmente o melhor, até!), porque sei que há-de aparecer a esquina onde me apetecia encontrá-lo, disponível para o segredo, para o silêncio, ou até para dizer "Há táxis logo ali!"

Eu prefiro ficar por aqui - em todas as esquinas, mesmo as afiadas, para indicar o táxi, assim encontre (e procure!) os meus Amigos: os que também lá estão (duas mãos cheias), os que seguiram em frente (oxalá sejam ainda mais felizes), os que ainda aí não chegaram (e que ansiosamente espero).

Porque qualquer rua sombria, gelada e deserta pode, ao dobrar da esquina, dar lugar a um Sol aberto, onde a alegria aquece o coração!

P.S.: Cheguei mesmo a tempo.  Ao virar da esquina (sempre este espaço tão surpreendente...) recebeu-me o sorriso acolhedor da Pessoa que eu ia encontrar. E lá voltou o Sol!

Da Criação (sacralizante)

"O mais profundo de uma palavra é o que há nela de sagrado. Deus tê-la-á dessacralizado quando ela criou o mundo. Mas nós sacralizamo-la de novo, quando o recriamos com ela."
in "Pensar", de Vergílio Ferreira (aqui)

Existe Mundo porque existe comunicação. Seja ela qual for.
Existe comunicação porque a tal obriga a singularidade da pluralidade e interdependência dos sujeitos.

Esta citação, extraída de "Pensar" de Vergílio Ferreira, onde tanta possibilidade pulsa, mede-nos o universo da palavra, num círculo significado-criação-significante-sagrado que une a dimensão terrena à dimensão divina que habita todos os que a proferem, que a ouvem, que a escrevem, que a entendem.

As palavras são sagradas.
Nelas mora um inestimável e inesgotável potencial de criação, de transformação, de afirmação, de afecto - um verdadeiro meio para criar mundos à sua imagem e semelhança.

Quais são as nossas palavras intimas? E as quotidianas?
Estranhamente, a sua intersecção devolve-nos um conjunto muito pouco povoado.

Este espaço de partilha e reflexão pretende estabelecer a ponte entre essas duas realidades da mesma palavra - o seu significado e o seu significante; a palavra no mundo e o mundo criado pela palavra.

Sugestões? Opiniões? Críticas? Claro! Bem-vindas!